Fernando Diniz e seu ego interminável
O ser humano é orgulhoso por natureza. Obviamente, cada indivíduo tem suas crenças e opiniões e irá defendê-las sempre que confrontado. Mas até que ponto é coerente manter esses pensamentos imutáveis e engessados?
Ex-jogador, Fernando Diniz ganhou os holofotes pela primeira vez em 2019 no Fluminense. Mesmo com um elenco limitadíssimo, o futebol apresentado pela equipe chamou a atenção: estilo "sem chutão", com as jogadas começando de pé em pé com o goleiro, jogadores trocando rapidamente de posição e a valorização da posse de bola. O "Dinizismo", no meio pro final daquele ano, começou a não surtir mais efeito e os resultados negativos culminaram na sua demissão. Importante frisar que mesmo tudo indicando que essa saída fosse necessária, a decisão não partiu dele, o que se mostrava ser um pequeno sinal da sua personalidade (exageradamente) forte.
Ainda em 2019, Diniz assume o São Paulo e termina o campeonato de pontos corridos na sexta posição. Já na temporada 2020/2021, o time acumulou vexames no Paulistão, Copa Libertadores e Sul-Americana. No entanto, o treinador ainda tinha respaldo dentro do clube muito por conta da boa campanha na Copa do Brasil e no Brasileirão, quando chegou a liderança neste e com 18 jogos de invencibilidade no geral. Com a assinatura do "tiki taka" do professor, a equipe paulista esteve perto de conquistar o campeonato nacional e a poucas rodadas do fim, uma sequência de 7 jogos sem vencer e o episódio com o jogador Tchê Tchê culminaram no vestiário desgastado e, consequentemente, no fim da linha para o treinador na equipe paulista.
Visto como revolucionário por uns e odiado por outros, os trabalhos de Fernando começaram a repetir ciclos, onde o time começava bem, encantava, mas quando vinha a má fase, estagnava de vez. O esgotamento do futebol era nítido e a atitude mais adequada e lógica nesse tipo de situação é recalcular a rota, alterando o estilo de jogo e/ou as peças. Mas essas mudanças nunca foram sequer cogitadas por ele e se alguém ousasse questioná-lo, era repreendido.
Ainda em 2021, teve passagens mais curtas ainda por Santos e Vasco, onde também não obteve resultados expressivos e continuou em baixa na carreira. No ano seguinte, acerta seu retorno ao Fluminense em meio a desconfiança de grande parte dos torcedores. O que se viu no segundo semestre de 2022 foi um verdadeiro futebol arte, onde o time e o próprio Diniz entraram em sintonia e apresentaram o melhor futebol do país no período. Uma temporada vista como positiva pelo terceiro lugar alcançado no Brasileiro, mas também frustrante pela queda na semifinal da Copa do Brasil e fase de grupos da Copa Sul-Americana.
Até aquele momento, as críticas eram quase inexistentes. Afinal, ele tinha nas mãos um elenco mais qualificado do que de trabalhos anteriores e os títulos pareciam, de fato, ser questão de tempo. A obsessão do treinador, time e torcida era a Libertadores da América, e após a virada histórica sobre o Flamengo na final do Carioca por 4x1, o ânimo aumentou mais ainda. Passada a turbulência em junho/julho, Fernando se manteve firme no cargo e enquanto fazia uma campanha sólida nos pontos corridos, avançava no torneio continental. A temporada foi coroada com o tão almejado título, o primeiro de expressão de sua carreira (tudo isso enquanto treinava a Seleção Brasileira simultaneamente).A tão sonhada Glória Eterna ,enfim, era alcançada pelo Tricolor e em pleno Maracanã. Mas com esse feito histórico, veio também um mal que afetou todo o Fluminense: o acomodamento.
É natural que, depois de "tirar um peso das costas", você tenda a relaxar um pouco mais, ainda mais um peso do tamanho de uma Libertadores pra uma instituição. Mas o que todos acharam que seria facilmente resolvido, rapidamente se tornou irreversível: a equipe carioca fez um campeonato estadual bem aquém do esperado e afundou na zona de rebaixamento do Brasileirão. Nesse meio tempo, houve o título da Recopa contra a famigerada LDU, que contribuiu mais ainda para essa frouxidão na postura do elenco.
Em meio a uma sequência gritante de derrotas, as coletivas e escalações do Diniz pareciam uma esquete humorística de tão bizarras. Improvisação de volantes na zaga, meia-atacante jogando de segundo volante, pontas fazendo as laterais. No pós jogo, jornalistas tentavam entender e questionar o porquê dessas decisões e se ele iria mudar o esquema tático (que até ali, não existia mais). Ele, no mais alto pedestal, rebatia todas as críticas de maneira severa, deixando bem claro ali que "eu sei de futebol, vocês não". Um egocentrismo muito grande, mas que não é exclusivo dele; os treinadores de futebol num geral tendem a se enxergarem como máximos conhecedores do esporte e nós, espectadores/torcedores/jornalistas, como meros ingênuos. Fato é que em junho de 2024 chegava ao fim mais uma passagem de Fernando Diniz pelo Fluminense, que foi sentida como um luto por ele e pelo elenco.
Pouco tempo depois, assume o comando do Cruzeiro. Nos primeiros jogos já era possível visualizar a sua metodologia sendo aplicada em campo (com mais dificuldade do que nas últimas equipes treinadas por ele). Mesmo com um fraco futebol apresentado, levou o Cabuloso para a final da Sul-Americana, onde acabou sendo derrotado pelo Racing. Após não conseguir classificar o time para a Libertadores do ano seguinte, as críticas se intensificaram, mas a diretoria optou pela sua manutenção no cargo. O que se via dentro de campo não era inédito: uma defesa frágil e um ataque ineficiente. Fora dele, nada de novo também: Diniz continuava a se eximir de qualquer culpa pelos resultados ruins e rebatia com rispidez a possibilidade de variação tática, mostrando que não havia aprendido a lição depois do ocorrido no Fluminense. Logo no começo de 2025, os dirigentes mineiros viram que já estava insustentável e desligaram o treinador, que terminou sua passagem no Cruzeiro com apenas 4 vitórias em 20 jogos.
Creio que todos os fatos citados anteriormente tenham respondido o questionamento feito no primeiro parágrafo. Existe uma diferença (mesmo que alguns discordem) entre "teimosia" e "perseverança". Na vida, em qualquer problema que se esteja passando, é necessário afastar-se para ver de cima o panorama e buscar métodos a fim de resolver. Com o Fernando não foi assim, pelo contrário, ele fechou-se ainda mais no seu círculo e ainda contava com o auxiliar técnico Eduardo Barros, que o bajulava e até o colocou na mesma prateleira de Johan Cruyff.
Em suma, Fernando Diniz possui ideias táticas e filosofias de jogo interessantíssimas, as quais já foram pauta de jornais estrangeiros e sempre impressionavam quem assistia, justamente pelo conceito inteligente de posicionamento que ele aplicava aos seus times, fora a mentalidade de motivação no vestiário, que é fundamental para os jogadores. No entanto, ele acabou se tornando seu próprio vilão e se negou a abrir mão das suas convicções para o bem coletivo das equipes que treinou. Hoje, perdeu muito do prestígio que um dia tivera e provavelmente nunca mais veremos seu auge como em 2022 e 2023.
O Dinizismo está morto? Só o tempo responderá.
Pedro Frozza
Comentários
Postar um comentário